Garimpeiras urbanas

Tpm / Moda / Casa

por Redação
Tpm #161

Garimpar móveis e objetos antigos é ao mesmo tempo glamour e poeira, é paciência e excitação. Mergulhamos no acervo de três caçadoras paulistanas para fuçar seus achados

Bem-vindo ao século 19
O predinho de 1890 na Sé foi o primeiro cartório da cidade de São Paulo. Portas gigantescas e um pé-direito altíssimo dão o ar de novela de época ao espaço que hoje abriga a Casa Juisi dos sócios Simone Pokropp e Júnior Guarnieri. O antiquário da dupla conta com 35 mil peças, que vão de roupas do século 19 a uma infinidade de sapatos, óculos, malas e acessórios, além de roupas feitas por Denner, Clodovil e vestidos japoneses pintados à mão. Tudo organizado por década. “Muitos estilistas trouxeram seus acervos pra cá. E hoje alugamos para cinema, seriados, publicidade e o que mais aparecer”, diz Simone. O cavalinho branco da foto de abertura, por exemplo, é de Marcelo Sommer.

Tudo começou com o hábito de Simone de colecionar. Na década de 90 ela garimpava bonecas e pequenos objetos por hobby. “Aos poucos fui migrando para as roupas e fazendo disso um negócio”, diz. No princípio Simone e Júnior compravam peças garimpadas e faziam a venda em casa mesmo. “Teve uma época em que trazíamos peças do Japão de navio”, lembra. Foi em 2010, quando a dupla se viu com um acervo bacana e que não poderia ser simplesmente vendido, que o negócio migrou para locação. “Nosso olhar sempre foi para a moda de cada época, não apenas para o que era antigo”, diz. Atuando no mercado de aluguel, passaram a comprar também objetos. Máquinas de escrever, relógios, os primeiros celulares, pager, brinquedos, máquinas fotográficas, espelhos, escovas de cabelo, bibelôs. Na Casa Juisi é possível caracterizar dos tempos de escravatura até a década de 90 sem perder nenhum detalhe.

Uma boa parte do garimpo é feito em casas de pessoas mais velhas que faleceram e a família precisa se desfazer de alguns objetos e roupas. “É muito louco entrar na vida das pessoas, olhar os detalhes. Muita coisa é revelada quando você remexe os armários e os quartinhos esquecidos”, conta Simone.

A Casa Juisi divide espaço com a Sé Galeria. São as residências artísticas trazidas pela curadora Maria Montero que mantêm a Casa com uma intensa circulação jovem. Um misto intrigante entre o antigo e o novo.

Vai lá: facebook.com/CasaJuisi

  

Velho com carinha de novo
Durante 16 anos a carioca Tânia Grimaldi foi executiva de marketing em grandes empresas. Trabalhou nas gigantes Coca-Cola, Alpargatas e Nestlé. Respirava consumo dia e noite. Um dia, há três anos, começou a achar que a vida que levava não fazia sentido. “Eu queria dar mais valor às coisas, ter a sensação de durabilidade”, diz. Foi aí que olhou em volta e reparou nos móveis antigos herdados da falecida mãe. “Percebi a importância dessas memórias na nossa vida e me deu o clique de trabalhar para não deixar esse tipo de coisa morrer.” Montou então a Casa Grim, que há dois anos ocupa o andar de baixo de uma casinha no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Ali, ela dedica seu tempo à restauração de móveis.

Tânia é procurada por gente que comprou ou herdou um móvel antigo e deseja lhe dar uma cara nova. Mas aparece também gente que teve a poltrona destruída pelo gato. Trabalha com marceneiros, serralheiros, eletricistas e tapeceiros terceirizados, mas quem retira os móveis é ela mesma. “Carrego até bufê”, diz. E garante: pra ela, o que mais importa não é assinatura do designer, mas sim o valor sentimental da peça, por isso conversa longamente com cada cliente, entende seu gosto, a história do móvel e pede fotos do ambiente onde ele ficará. “Muitas vezes o móvel é um elo com o passado e reformá-lo é como fazer um carinho na família”, diz. No geral, a cara nova proposta por Tânia mistura o design original com um elemento contemporâneo, como quando coloca cor onde antes tinha apenas marrom. “Respeito muito o gosto do cliente e sempre proponho coisas que farão sentido na casa onde o móvel vai ficar, mas dou meu toque de estilo, claro.”

A vantagem de reformar um móvel antigo? “Ter a certeza de uma qualidade que já não existe mais”, crava Tânia. “Não se pode mais usar essas madeiras, tipo jacarandá, para fazer móveis. Em tempos de consumo e até de relações descartáveis, preservar o que foi feito é respeitoso.” As peças que Tânia tem na loja estão todas à venda e funcionam como uma amostra do trabalho que faz. “Essas peças são meu cartão de visita, com elas posso mostrar o tipo de acabamento que fazemos, por exemplo. Porque acabamento é fundamental no mundo do restauro.”

Vai lá: casagrim.com.br

 

Tá à venda?
A jornalista Vivian Lobato queria começar um blog para falar sobre garimpo de móveis. Ela e o namorado, André Visockis, tinham acabado de mobilhar a casa e colecionavam dicas quentes para quem queria comprar móveis com estilo e qualidade sem gastar muito. André foi contra e para convencer a namorada de que deveriam ir muito além do blog fez uma apresentação em PowerPoint. Trabalhando em casa como designer, André convenceu Vivian de que deveriam colocar a energia em um negócio próprio no setor de garimpagem de móveis e objetos antigos. “Passamos dez meses estudando o mercado e pensando em diferenciais”, conta Vivian, que durante um ano e meio se dividiu entre o trabalho na Fundação Bienal e o Apartamento 61, empresa que abriu com André. Os diferenciais escolhidos foram a venda on-line e o preço transparente, que mostra quanto estão lucrando em cima de cada peça.

Hoje, pouco mais de um ano depois de colocarem a loja no ar e há seis meses trabalhando apenas em seu próprio negócio, Vivian conta que o e-commerce é ótimo para a venda de objetos menores, mas não se mostrou a melhor ferramenta para a venda de móveis, já que muita gente quer ver em detalhes, tocar, sentar. “Recebemos as pessoas aqui em casa [o apartamento 61 em si], mas nosso plano para 2016 é mudar para uma casa e fazer um showroom”, conta. O preço transparente continua, eles garantem. “Esse é um mercado que pode ser muito abusivo. Tem gente por aí que paga R$ 500 numa peça, gasta R$ 1 mil para restaurar e vende por R$ 20 mil. Margem gigantesca não é a nossa praia”, garante André. E completa: “Alguns veem mobiliário como arte, nós vemos como uma cadeira para sentar”.

Nem todos os móveis à venda no Apartamento 61 estão no apartamento 61 em Pinheiros, São Paulo. Ali vemos alguns objetos à venda e móveis de pequenas proporções que se confundem com a decoração da casa. A pergunta mais comum de quem entra no apê é: “E isso aqui? Está à venda?”. O plano com o showroom é resolver essa questão e também trazer do sítio no interior a maior parte das peças estocadas. É lá também que o casal mantém uma pequena oficina para consertos básicos. “Preferimos comprar e vender as peças ‘no estado’, com as marcas do tempo. Isso evita falsificação e o cliente pode dar o toque dele no restauro”, conta Vivian.

Vai lá: apartamento61.com.br

Créditos

ESTILO Marcio Banfi

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