por Redação

Carro do ano, roupa de grife e uma namorada gostosa dão conta do recado?

O que todo mundo quer da vida? O que todos buscam? O carro do ano? A casa própria? A namorada gostosa? A roupa de grife famosa? O aparelho de som último tipo? A televisão de 42 polegadas? Ou o quê?

Não seria tudo isso e muito mais? Talvez tudo o que exista? Nada basta. Mas será que é isso mesmo o que todo mundo quer? Não estaríamos enganados? Não seria outra coisa o que queremos? Porque as coisas, parece, não são. Coisas pedem mais coisas. O carro do ano levará ao carro importado. A casa própria levará ao dúplex. A namorada gostosa levará à amante deliciosa. E nada nos bastará.

Às vezes parece que o homem é um ser adquirente. Embora esteja claro que é assim porque está condicionado para que assim seja. Há quem se sirva de suas fraquezas e ansiedades para aferir lucros e vantagens.

Então, o que quer o homem, de verdade? Amor? Sim, todos nós queremos amor. Mas amor somente não lhe basta, embora ele mova o mundo por uma paixão. A história do homem nos conta; ainda é pouco. Ele continuará procurando, mesmo tendo um ou vários amores. Seria liberdade? Já tive essa de ir e vir e não me foi suficiente. Sendo o homem uma liberdade a realizar-se, nunca é suficiente a que se tem. A perna leva ao braço, e deste ao corpo todo. Arrisquei em busca de mais, estupidamente, e perdi o pouco que julgava ter.

Houve momentos em que, livre (embora foragido), andei pela avenida Paulista, da rua Consolação até a rua Treze de Maio. Seguia por um lado da avenida e voltava pelo outro. Olhava para as gentes coloridas, os prédios lindos, e chorava andando aquelas calçadas. Angústia, solidão e o fato de a polícia estar me procurando me destruíam. Não podia estar junto aos que mais amava. Já nem tinha certeza se ainda seria mesmo amado.

Estava livre, com dinheiro no bolso e o mundo que me falavam enquanto preso estava ao alcance da mão. No entanto, parecia que o céu e a terra haviam morrido juntos e eu ficara para o enterro. Não podendo me tomar de meus limites, meus males se transformavam em dores. Não, liberdade física não era suficiente.

Queremos felicidade.

Mas antes há que se pensar o que vem a ser felicidade. Imagino que seja satisfação de viver e o grau de realização que esperamos alcançar em nossas vidas. Quais os indicadores objetivos e subjetivos de nosso bem-estar? A alegria, a paz que conquistamos? Mas são emoções, e tudo está no campo da relatividade, nada que sempre dure.

Há diferença em estar feliz e em ser feliz. Estar depende de um momento, de um acontecimento que me faz feliz. Ser colocado em liberdade me fará feliz. Estar com minha companheira me fará feliz.

Ser feliz já fará parte de uma avaliação completa de minha existência. Inclui ter liberdade. Alcançar sucesso na profissão/arte que escolhi. Conseguir me relacionar bem com as pessoas que me cercam e com as periféricas. Alcançar uma grande produtividade num plano social. Chegar a ser bem-sucedido na criação e educação de meus filhos. Amar e ser amado. E inúmeras outras coisas que me realizariam e me tornariam autenticamente feliz.

Imagino que haja vários caminhos. Alguns mais evidentes. Por exemplo, adaptar minha vontade e desejo à realidade. Aceitar meus limites humanos e exigir de mim uma disciplina compatível às possibilidades que possuo. Querer apenas o que considero que posso (se bem que não sei ao certo se é só isso que posso). Esse é o caminho para se encontrar harmonia e paz, um dos meios de alcançar a felicidade.

Outra opção é enfrentar, com minha capacidade, a realidade e submetê-la às minhas necessidades e desejos. Possuir e transformar os fatos para encontrar a satisfação de minhas vontades. Construir, com meu engenho e sagacidade, um mundo que estabelecerá o que considero melhor (só que não sei se o que considero melhor é melhor mesmo) e que me garantirá a felicidade.

Buscar o prazer e correr da dor não é exatamente o meio de atingir a felicidade. Mas me parece o começo de um caminho. A criança, basicamente, jamais vai se machucar. Porque, quando doer, ela pára imediatamente. A natureza nos cria vivos, o prazer melhora e a dor atrofia.

O maçarico da vida nos mostra o quão avassaladora é a nossa experiência pessoal de sermos o que somos. Vivemos esse tumulto, essa sede com fome. Entre o que somos e o que queremos ser, navegam rios e mares. Todos queremos ser felizes, mas navegamos, ou somos forçados (?) a navegar, à margem, contra o vento. Nada nos é muito favorável.

Há muitas outras maneiras de se pensar caminhos para chegar à felicidade. Posso estar em uma fase particularmente difícil de minha vida, mas me considerar feliz. Sei que será passageiro, superável. Como posso esta vivendo uma sucessão alucinante de momentos felizes, mas minha vida revelar-se um melancólico naufrágio. É possível encarar a felicidade como progresso contínuo. A conquista de um objetivo sedimentando a base para os outros seguintes. Seria o estar feliz construindo o ser feliz. Imagino esse seja o caminho mais lógico.

 

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