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Princesas de aba reta

por Natacha Cortêz

Na última Virada Cultural, a Tpm grudou nas Pearls Negras - o trio mais quente do morro do Vidigal

Na noite do último sábado (17), a equipe da Tpm foi até um hotel no Centro de São Paulo encontrar as Pearls Negras – o trio de rap mais quente e gracioso do Vidigal, comunidade carioca pacificada há cerca de dois anos. As meninas tocariam na Virada Cultural na madrugada de sexta pra sábado, precisamente às 3h. Era a segunda vez que se apresentavam na capital paulistana, e o palco da vez era a Choperia do Sesc Pompeia.

Integrantes da companhia de teatro Nós do Morro, Alice Coelho, 18, Mariana Feitosa, 17, e Jennifer Loiola, 17, cantam rap há cinco anos, incentivadas pela produtora musical Jeckie Brown, que dava aulas de rima no casarão do grupo. Mas o sucesso aconteceu mesmo quando a gravadora inglesa Bolabo Records resolveu apostar no grupo. As garotas foram assunto nos sites londrinos da Dazed and Confused e Noisey, que lançou o clipe com exclusividade.

Em dezembro saiu no Soundcloud a primeira mixtape, Biggie apple, com sete faixas produzidas pelo inglês David Alexander, com um som que mistura rap, funk e batidas de trap. As rimas são todas compostas pelo trio, que gosta de falar sobre a vida na favela, romances e empoderamento feminino.

Alice, Mariana e Jennifer descem – necessariamente nesta ordem – e nos encontram no lobby do hotel. Estão juntas, e vão ficar assim até nosso último minuto com elas: grudadas o tempo todo. Se encontraram muito novinhas no Nós do Morro. Alice, a mais velha, tinha onze anos quando conheceu Mariana, na época com dez. Junto das três estão Jeckie e Érick, o produtor. Jeckie não é apenas a mulher por trás do Nós do Morro, é ainda a responsável pelas Pearls, e a criadora do grupo.

Cumprimentamos os cinco. Aproveito pra demorar no abraço que dou nas três meninas e comentar o look de Alice. Ela vestia um conjunto de oncinha de saia lápis e cropped top, combinando com um colar dourado gigante e umas botinhas pretas sem salto.

 

"As rimas são todas compostas pelo trio, que gosta de falar sobre a vida na favela, romances e empoderamento feminino"

 

Resolvemos sair pra jantar qualquer coisa. “Qualquer coisa menos hambúrguer”, uma delas grita. Vamos andando até o restaurante, que fica a poucas quadras do hotel. Apresso o passo pra acompanhar as três. Impossível. Além de muito rápidas, elas incrementam a caminhada com movimentos coreografados. Não caibo ali, mas pelo menos sei o refrão de Pour it up, hit da Rihanna que elas vão cantalorando pela rua. Puxo assunto pra falar da cantora, elas comentam um blá qualquer, continuam a dança e se afastam mais, com a rebeldia e arrogância típicos da adolescência. Não tenho chance nenhuma com elas.

Chegamos ao restaurante e as três pedem exatamente a mesma coisa: milk shake de morango, com muita cobertura de calda vermelha e suspiros até não querer mais. Ah, e um hamburguer gigante, feito no pão de miga, que elas logo perguntam do que se trata. Mariana pede o dela sem bacon e sem picles. Pra todas a carne precisa ser bem passada. O prato vem acompanhado de batata tipo chips – que elas logo rejeitam e oferecem pra quem quiser comer. Os três sanduíches ficam pela metade, os milk shakes elas quase tomam tudo. Pergunto se gostaram da comida. Uma delas solta um “achei nada demais não”. A outra dispara “não sei porque a gente pediu hambúrguer, só curti o shake”.

O jantar é o único momento das oito horas que passamos com trio em que conseguimos parar e conversar com elas. Na conversa, contaram dos tempos de Nós do Morro. “A gente aprendeu a cantar rap com a Jeckie. Antes dela, nunca tínhamos imaginado isso”, diz Mariana, que emenda a falar de sua diva inspiradora na música, Beyoncé. A de Alice é Nick Minaj, e Jennifer ama Ciara. Do rap nacional, elas gostam de ouvir Racionais, MV Bill, Criolo Doido, Emicida e D2. Quando pergunto sobre os meninos do funk ostentação de São Paulo, elas dizem que já ouviram falar muito, mas não é o tipo de música que ouviriam em seus iPods.

Ficou combinado que as três tirariam um cochilo pós jantar, e que depois acompanharíamos elas enquanto se maquiavam, no quarto. Foi mais ou menos assim. Das 22h às 1h30 não pudemos ficar com as Pearls. Quando subimos pra tirar as fotos delas se maquiando, ficamos 15 minutos no quarto. Nesse tempo, Alice escolheu passar um batom Chanel vermelhíssimo, fez babyliss nos cabelos e me contou que o que tocava no quarto era Drake - um rapper canadense bonitão que namora Rihanna. Mariana e Jennifer esperavam fazendo caras e bocas pro espelho, retocando a máscara de cílios, ensaiando poses e cantarolando qualquer rima que não as do Drake.

No final dos nossos 10 minutos entra Deja. Coreógrafa, produtora, babá e stylist das Pearls. Ela vem dizer que as meninas estão atrasadas para a passagem de som, que devia acontecer no Sesc mesmo, a 1h.

 

"As três se revezam e nenhuma brilha mais que a outra. Na verdade, se completam e parecem se divertir o tempo todo. Apesar de disciplinadas, fica difícil dizer que estão de fato trabalhando"

 

Na van que leva o grupo até o show, vai apenas a fotógrafa, Olímpia Beltrão. Ela me conta que no caminho as meninas se esquecem de olhar pelas janelas e se concentram em seus iPhones. Quando não estão mexendo nos aparelhos, estão cantando alguma coisa da Beyoncé. “E elas gostam de posar pra câmera. Têm direitinho as posições de cada uma, e a carranca de bravas”, recorda a fotógrafa.

No Sesc Pompeia, as garotas vão direto pro camarim. Ficam quase o tempo todo concentradas, em silêncio, que só quebram pra comentar algo que viram no celular. Sempre juntas, sentadas uma ao lado da outra. Em nenhum momento daquela noite – que se estendeu até às 5h da manhã – se separaram. Quando pergunto se rola frio na barriga ainda, elas começam a rir e contam que nos primeiros shows, chegavam a chorar antes de entrar no palco. "Dava dor de cabeça, dor de barriga. Agora é tranquilo", entrega Alice.

O show, que começou na hora marcada, às 3h, e durou 45 minutos é contagiante. Elas não param um minuto. Para cada música, uma coreografia diferente, sempre bem treinada. Na primeira música, Jennifer parece que vai protagonizar a apresentação toda. Na segunda, Mariana aparece mais. Daí por diante, as três se revezam e nenhuma brilha mais que a outra. Na verdade, se completam e parecem se divertir o tempo todo. Apesar de disciplinadas, fica difícil dizer que estão de fato trabalhando.

A choperia do Sesc não lotou, talvez por ficar fora da rota do restante da programação da Virada. Mas o público se envolveu completamente com a apresentação das Pearls. Aquela coisa de “ninguém ficou parado”. Ninguém ficou mesmo. Dava pra perceber quem eram os fãs de carteirinha também, ou melhor, as fãs. Três ou quatro meninas faziam coro logo na frente do palco, vestidas como as Pearls – calça colada, brincões, cropped tops, coturnos e cabelo black. Sabiam todas as letras e gritavam nos refrões. Na plateia também estavam Deja, Erick e Jeckie – orgulhosos e de sorrisos rasgados. Motivos, eles têm de sobra. As Pearls Negras têm turnê internacional marcada pro segundo semestre de 2014. Alice Coelho está no elenco da novela das 18h. Pensando em você, o primeiro clipe das meninas, é o tema da campanha de Dia dos Namorados de uma rede de fast-fashion brasileira. Orgulho e sorrisos rasgados é o mínimo. 

* Abaixo, o primeiro sucesso das meninas, Pensando em você. Depois, Guerreira, o segundo clipe. Os dois filmados no Vidigal. 

 




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