por Carol Sganzerla
Tpm #91

Aos 76 anos ele conta a novela de sua vida: mulheres, teste do sofá, drogas, medo da morte

Ele retrata a força, a graça e a fragilidade das mulheres em todas as suas novelas – mais de 15. Leva os dramas da vida real para o horário nobre da Globo e escreve folhetins há mais de três décadas

E ela volta. Agora, com um presente nas mãos, interrompe a entrevista sem pedir licença e dramatiza a história que Manoel Carlos ouvia uma hora atrás, enquanto aguardava a repórter da Tpm num dos seus restaurantes preferidos – no também preferido bairro carioca do Leblon. A aspirante a atriz e “budista-que-acredita-que-não-se-pode-desistir-dos-sonhos” clama, com lágrimas nos olhos, para que ele veja “o teste que fiz para sua novela”. O discurso é acompanhado de um embrulho com laço vermelho que faz questão que o autor aceite “do fundo do coração”. Ela se desculpa pela intromissão e pelos trajes de academia que exaltam decote e barriga sarada. Manoel é atencioso sem prolongar o assunto. Aceita o presente – pelas dimensões, uma fotografia emoldurada –, mas não sem antes garantir que era de autoria da moça.

A cena presenciada numa sexta-feira qualquer do Rio de Janeiro é tão recorrente quanto as Helenas que protagonizam as tramas do novelista. Há mais de 30 anos escrevendo folhetins para o horário nobre da Globo, Manoel Carlos Gonçalves de Almeida não vê um dia terminar sem que seja parado por jovens atores com pedidos de uma chance na tão almejada carreira televisiva. Autor de sucessos como Por Amor (1997), Laços de Família (2000), Mulheres Apaixonadas (2003) e Páginas da Vida (2006), suas novelas retratam os dramas que ele colhe ali, no Leblon, onde mora há 30 anos, nas histórias de família, nas páginas dos jornais, na vida que pulsa e que não alivia ninguém. O bairro carioca era só mais um entre os tantos da cidade até o autor fazer do lugar set de novela e cartão-postal do Rio de Janeiro. Traição, disputa, ciúme, preconceito, doença, paixão, romance, homossexualismo, morte; os temas estão todos lá para prender o telespectador ligado à novela da vida real. A próxima, Viver a Vida, que estreia este mês, não fugirá à regra: rixa entre modelos, transtornos alimentares, doentes terminais, crise econômica.

Por mais que Maneco faça pesquisas de campo para levar às tramas os conflitos inerentes aos seres humanos – e principalmente os femininos, seu universo de trabalho preferido – ele carrega uma senhora bagagem nas costas dos seus 76 anos de vida. Nascido em 1932 depois de duas irmãs, no Pari, na capital paulista, o filho de um comerciante industrial com uma professora tocava o terror nas ruas do bairro e aos 11 anos se viu trancado num colégio interno. De lá, só saiu aos 15 para se tornar ator de teatro amador e ver a chegada ao Brasil da televisão, a qual se tornaria sua segunda casa. Participou de teleteatros na TV Paulista, escreveu programas e produziu musicais na TV Record, atuou em novelas na TV Tupi, acompanhou as transformações da televisão e as possibilidades da tecnologia até se firmar como um dos mais respeitados novelistas do país.

Um homem de família

Foi nas quebradas do Pari que Manoel se casou (aos 19 anos), teve dois filhos (aos 19 e 22), Manoel Carlos Jr. e Ricardo; casou-se novamente (com a hoje deputada estadual Cidinha Campos), teve uma filha, Maria Carolina; viu sua primeira mulher morrer num acidente de carro (em 1972) e seu filho Ricardo falecer por complicações da Aids (em 1988). Depois de viver toda essa novela em vida real, mudou-se para o Rio de Janeiro, encarou a segunda separação e apostou num terceiro casamento, com a museóloga Bety, 54, com quem vive há 32 anos junto aos filhos Júlia, 26 (a Leinha, de Caminho das Índias), e Pedro, 17. É sobre eles, a família, os relacionamentos, sexo, drogas, morte e envelhecimento que Manoel Carlos fala com a maior dedicação, de forma pausada – e num português antigo –, com a reportagem da Tpm. O autor, que não se deixa ser chamado de “senhor”, é educado ao extremo, inteligente idem e decifra o universo feminino como poucos. Com vocês, um Manoel para mulheres.

Tpm. Por que você foca nas suas tramas o universo feminino?
Manoel Carlos. As mulheres são mais confessionais, o que no meu caso ajuda muito. Elas falam. Já escrevi até cenas assim, em que a mulher é traída pelo marido, reúne as amigas e choram todas. Elas têm menos pudor para confessar casos de insucessos. Os homens evitam falar. Como as cenas que escrevo não têm uma ação explícita, mas sim uma ação interior, as mulheres oferecem um universo mais rico. E mais: as acho mais dignas, mais sérias, mais verdadeiras.

Mais complexas? Também. Mais complicadas. E é uma coisa que tenho de criança e de adolescência, sempre escrevi mais sobre mulheres e para atrizes. Meu livro predileto é Madame Bovary. A profissão de atriz é a melhor do mundo para uma mulher. Porque ela cria uma liberdade de a atriz ser prostituta, freira, honesta, desonesta. Os homens, de certa maneira, já têm na vida real um leque mais amplo de oportunidades.

Quais mudanças você viu no comportamento das mulheres em mais de 50 anos de profissão? As mulheres tiveram uma evolução social e uma abertura muito grande em relação ao comportamento. Hoje, em todo lugar tem mais mulheres do que homens em posições de comando. As juízas, por exemplo, são comprovadamente mais eficientes, mais enérgicas e mais dedicadas aos processos.

 

“Os casamentos acabam muito antes de acabar. Os homens aguentam um casamento duradouro ruim. A mulher, dificilmente”

 

Por quê? É uma soma de coragem e abnegação. As mulheres são muito corajosas. O silêncio que muitas vezes o homem faz diante das coisas a mulher não faz. Por exemplo, as minhas Helenas são mulheres imperfeitas, fortes e ao mesmo tempo falhas e frustradas em algumas coisas. Elas mentem com uma grande tranquilidade e enganam com facilidade qualquer pessoa.

Qual das suas Helenas mentiu mais? Todas mentiram. A Helena de Felicidade, da Maitê Proença, fingia uma gravidez. Em Laços de Família a Vera Fischer esconde que a filha tem leucemia e que o pai da menina é o José Mayer, mas depois revela porque precisa fazer um filho com ele para salvá-la. Em Páginas da Vida, a Regina Duarte esconde que tirou aquela criança com síndrome de Down do hospital. Elas são heroínas absolutamente defeituosas. A mentira pra mim é um traço feminino fundamental.

Fundamental para quê? Para a sobrevivência. Mesmo com o aperfeiçoamento das relações humanas, ainda existe um preconceito grande contra as mulheres. E essa mentira não é uma mentira cavernosa. A mentira também é uma necessidade.

Em Viver a Vida você vai abordar o tema superação. A mulher supera a dor mais fácil do que o homem? Muito. Isso está no jornal todos os dias, mulheres que perdem filhos com bala perdida. Quem está na primeira página? A mãe. Nunca é o pai. O pai está sofrendo, mas é a mãe que vai pra frente da câmera, pra frente do policial. O homem fica com uma mágoa silenciosa. Ontem o jornal bateu uma foto de uma mãe que perdeu a filha na porta do hospital. Ela dizia: “Vou ter que superar porque tenho outros filhos e a vida tem que seguir”. Minha irmã mais velha perdeu um filho, meu afilhado, com 14 anos, afogado no mar. Ela tinha mais cinco filhos, então falou: “Não posso, porque perdi um, perder os outros”. Ela segurou tudo. Mulheres têm essa força.

Você também perdeu um filho. Como foi? Ele teria hoje 54 anos. O Ricardo morreu em 1988, com 33 anos, de complicações de Aids. Ele foi um ator muito interessante, escreveu novela comigo para fora, trabalhou muito em teatro.

Você pensa muito nele? Ah. penso [com pesar na voz]. Filho é a única perda que não tem superação. Não choro mais, mas não esqueço. Faço umas horas da saudade sozinho. Quando a filha do Drummond [Carlos Drummond de Andrade] morreu ele disse: “Não é natural a morte de um filho. Filho tem de fechar os olhos dos pais. Os pais não podem fechar os olhos dos filhos”. Essa coisa tão simples e que é verdade.

Há diferença na criação de filho homem e de filha mulher? Sim. Os pais privilegiam as filhas e as mães, os filhos. Não me lembro, por exemplo, dos sarampos dos meus filhos homens, das doenças, porque eu e minha [primeira] mulher íamos para a boemia e minha sogra morava conosco. Às vezes chegava em casa e ela vinha: “O Ricardinho passou mal, tivemos até que chamar um médico”. A gente bebia pra burro, fazia umas farras enormes. E a educação de filho homem sempre se rezou pela cartilha mais antiga da humanidade: “Aos homens tudo e às mulheres muita atenção”.

Você tem o Júnior, de 56 anos, e o Pedro, de 17. O que mudou na criação de um filho para o outro? Meus dois primeiros filhos foram homens. A Maria Carolina ficou com a mãe quando me separei, mas a via todos os dias. A Júlia e o Pedro já me pegaram afinado com a educação moderna, com a liberalidade, com uma série de concessões que estão implícitas na vida de qualquer adolescente. Ainda sofro com isso. Não durmo enquanto meus filhos não chegam.

Não prega o olho? Não. Anteontem teve o casamento da Stefany [Brito], a Júlia foi. O que fiz? Falei: “Vou tirar uma soneca à tarde e fico escrevendo até você chegar”. Ela chegou às quatro da manhã. Esperei amanhecer e fui dormir. Inverto para poder esperá-los.

Você pergunta com quem ela sai, tem ciúme? Tenho. Na verdade, não é ciúme, não me considero dono do filho. A gente cria filho para o mundo. Mas tem um extremo cuidado. Hoje os filhos saem e a gente não sabe se voltam. Tem gente que vira para o lado e dorme, não critico, posso até invejar em algumas ocasiões. Eu não consigo! Fico doente, preocupado: “Comeu? Jantou?”.

Tem esse mesmo cuidado com seu filho de 56 anos? Ele vem ao Rio e digo: “Se agasalha em São Paulo, está frio pra cacete lá!”. E ele: “Pode deixar, papai”. Hoje é uma relação de amigo, sou 19 anos mais velho que ele.

Você se casou aos 19 anos porque engravidou a namorada? Ela estava grávida de quatro meses. Falei com meu pai que queria casar. Ele levou um susto e disse: “É muito cedo, você tem de estudar”. Falei: “É, papai, mas ela tá grávida”. Meu pai tinha uma dignidade incrível e casei. E fui muito feliz. Fui muito feliz nos meus casamentos. Eles acabaram quando vimos que a felicidade estava acabando. Não arrastei nenhum cadáver. Tive coragem, e as minhas ex-mulheres também, de acabar com o casamento mesmo tendo filhos pequenos. Sou pela felicidade.

Isso é raro, né? É. Os casamentos acabam muito antes de acabar. Você terá muita sorte e coragem se fizer com que essa agonia dure pouco. Os homens aguentam mais um casamento duradouro ruim. A mulher, dificilmente. Conheço mulheres que eram felizes, tinham filhos pequenos e se apaixonaram por outro homem. E disseram: “Temos que acabar com o casamento”. “Por quê?” “Estou apaixonada por outra pessoa.” O homem, enquanto puder manter, mantém.

Homem se acomoda? Ele imagina: tem que mudar a cama, o colchão, o lugar na mesa, esvaziar as gavetas, comprar móvel. O homem quando sai, e falo por mim, leva a roupa, livros e CDs. A mulher, se for embora, vai com a roupa do corpo. Apaixonada ela vai. Esse desprendimento é muito feminino. O próprio amor materno dá esse desprendimento. A minha mãe a vida inteira foi assim. Se meu pai chegasse com um bombom pra cada filho e um pra ela, todos nós comíamos e ela guardava o dela para dar a um de nós.

Como foi sua criação? Foi tumultuada na medida em que fui uma criança extremamente complicada. Minha mãe dizia: “Ele é muito levado, mas tem um coração de ouro!”. Com 10 anos estava sem controle. E a minha mãe era absolutamente incompetente para controlar, era incompetente para a vida prática. Não sabia fritar um ovo, ia fazer café e queimava os dedos. Vivia sonhando. E a vida inteira andou descalça. Meu pai não era fiel. A gente percebia, mas mantinha as aparências. Porém, na velhice, ficaram de mãos dadas. Ele morreu dois anos antes dela, ele com 91, ela com 93. Não poderia supor que minha mãe vivesse tanto tempo.

Como eles te controlaram? Meu pai me trancou num colégio interno, de padres espanhóis agostinianos, aos 11 anos. Apanhei muito. A educação na época batia muito e os pais sabiam. Eu era realmente incontrolável. Fiz coisas de risco, de pular de ponte quando vinha o trem. E fazia coisas engraçadas. A minha irmã dava aulas de piano para meninas. Eu colocava um roupão, descia a escada que acabava bem em frente ao piano e abria o roupão. Ela perdeu várias alunas por causa disso. Olhava no buraco da fechadura as primas tomando banho, levantava saia de menina. Então meu pai achou bom me trancar no colégio. No começo foi duro, mas depois não trocava aquela vida por nada. Ali descobri a leitura, a música. Os padres eram europeus, tinham uma cultura extraordinária. Nunca tirei um diploma na vida. Com 15 anos saí do colégio. Aos 16 já fazia teatro amador.

Por conta própria? Sou de uma geração de autodidatas. Tudo o que aprendi foi lendo, indo ao cinema, ao teatro, ouvindo música. A gente lia muito na biblioteca pública. Para ter acesso ao teatro fui figurante de ópera, “claquete”, ganhava ingresso para bater palmas. Eu, o Antunes Filho, o Flavio Rangel tínhamos acesso gratuito ao Teatro Municipal. Quando inaugurou o Teatro Brasileiro de Comédia [TBC], que foi a nossa escola, íamos assistir a ensaios, espetáculos, vi a estreia do Paulo Autran como ator profissional. Era um tempo bom.

Como entrou para a televisão? Entrei para a TV quando ela tinha menos de um ano de vida. Fazia parte de um grupo de teatro amador, dirigido pelo Antunes Filho. A TV Tupi, a única no ar, convocava grupos amadores para preencher os horários.

E como se tornou autor de novela? Sempre escrevi para a televisão, desde 1951. Fiz mais de cem textos para o Grande Teatro Tupi, por exemplo. Fiz também musicais e programas jornalísticos e cômicos. Em 1978 o Herval Rossano [diretor de TV] me convidou para adaptar o romance Maria Dusá, de Lindolfo Rocha, para o horário das seis, da Globo. Peguei gosto e não parei mais.

Qual é o maior prazer em escrever novela? Sem dúvida a receptividade do público. A novela perde a função se ninguém vê. A minha maior alegria é quando encontro uma pessoa que diz: “Assisti a sua novela ontem. Puxa vida! A minha mãe faz igualzinho àquilo”. “Tinha um tio que é exatamente aquele sujeito.”

São mais de 30 anos. Não cansa? Cansa, como imagino que canse qualquer trabalho. Nunca fiz outro em toda a vida. São mais de 50 escrevendo para a TV.

Você costuma defender causas sociais em suas tramas. Novela vai além do entretenimento? Pela força das novelas no Brasil, elas têm um compromisso social grande. Fico lá vendendo banco, carro, por que não posso “vender” doação de medula óssea? Em Laços de Família (2000) descobri que não havia doação e uma das razões era porque se falava em transplante. As pessoas pensam: “Transplante?! Eu não vou nessa”. Na hora que você diz que não precisa abrir seu corpo e ainda mostra aquela menina com leucemia na novela, forma fila no Inca pra transfusão de medula. Isso vale qualquer prêmio.

Você assiste à TV? Pouco. Fico admirado com os atores de novela falando em entrevistas: “Só vejo TV a cabo e Jô Soares”. Como é que este rapaz ou esta moça faz novela e não vê o que estão fazendo seus colegas? Isso é um desprezo por aquilo que faz. O ato de representar considero sagrado. E não precisa ser ator de teatro pra ser sagrado. Aí se diz: “O teatro é que é fundamental”. Claro, o teatro é a mãe disso tudo.

Ganhou dinheiro com as suas novelas? Sim, é um trabalho muito bem remunerado. Renegocio salário com a TV Globo pelo menos a cada dois anos.

Seu salário atual ultrapassa os R$ 100 mil por mês? Prefiro responder que o que ganho me permite viver tal como vivo.

O que faz com o dinheiro que ganha? Viajo bastante. Eu, minha mulher, filhos e netos ficamos dois, três meses por ano fora do Brasil. E a Júlia mora e estuda nos EUA quando não está trabalhando.

Como pensa na trama principal de uma novela? Penso: “Que história vou contar para a Helena?”. Desta vez estou imaginando que seja minha última novela. Tenho 76 anos e um filho de 17. Por mais que eu viva, não vivo mais 20 anos. Então, é preciso que eu pare. Tenho vontade de que seja a última sem nenhuma morbidez.

 

“Depois de certa idade, faz-se mais sexo com a cabeça do que com o resto do corpo. O fundamental é não perder o desejo”

 

Você teme a morte? A morte é a mais fiel das companheiras, pois nasce conosco, permanece ao nosso lado por toda a vida e nos leva quando tem que levar. Não a vejo com horror. Muitas vezes me surpreendo sorrindo ao pensar nela. Estou naquela idade em que vir a morrer não vai surpreender. Ninguém dirá: “Nossa, mas morreu de quê? Era tão novo!”. Para mim, morte é invisibilidade, o que não significa não presença. Gosto muito dos versos de Fernando Pessoa que traduzem isso: “A morte é a curva da estrada. Morrer é só não ser visto”.

Como lida com o envelhecimento? Com resignação. Sei, desde cedo, que viver é uma doença incurável. Vivo consciente de que um dia a mais é um dia a menos. Confesso que muitas vezes dói, dói fundo, mas nunca – até agora – pensei em desistir.

De que forma o envelhecimento ajuda ou atrapalha a vida sexual? Depois de certa idade, faz-se mais sexo com a cabeça do que com o resto do corpo. Mas existem recursos na medicina que prolongam a vida sexual de homens e mulheres com satisfação. O fundamental é não perder o desejo. Enquanto há tesão, há vida sexual ativa.

O que muda na vida sexual de um casal com tantos anos de convivência? Fala-se mais e faz-se menos. Mas faz-se menos com mais prazer do que quando fazia-se mais e falava-se menos.

Como manter um casamento que já dura 32 anos? Tem que ter tolerância, paciência e amor em primeiro lugar. A tolerância e a paciência têm um percentual muito importante para se ter essa felicidade.
Sua mulher não enlouquece com as atrizes que se aproximam para pedir trabalho? Não, porque há confiança e lealdade na relação e quando nos casamos eu já tinha 20 anos de profissão. E ela não vê nessas aproximações nenhuma intenção que não seja a de procurar um lugar ao sol.

Como lida com as insinuações de mulheres que fariam o “teste do sofá” para estar em uma novela sua? Vejo com naturalidade as atrizes se aproximarem. Até admiro quem faz isso, já que é uma forma objetiva de pedir trabalho. E não sinto nada que possa ser interpretado como assédio ou insinuação. Claro que todas são carinhosas e querem conquistar minha simpatia, mas isso é o que fazem também as vendedoras de loja.

A cultura da celebridade faz o “teste do sofá” ser comum na TV? Posso lhe garantir que existiu, e muito, nos anos 50 e 60, mas não existe mais. As mulheres já não são passivas como antigamente. Hoje elas denunciam. Há pouco tempo tivemos um exemplo das consequências disso na Globo. Além de repudiado pela “vítima” e pela esposa, um produtor foi demitido e ficou com uma péssima reputação entre homens e mulheres, por ter assediado uma atriz.

Sobre o uso de drogas na televisão, como era quando começou e como é hoje? Na época em que comecei, em 1951, as drogas consumidas eram a maconha e o lança-perfume. Muito inofensivas para o que veio depois. Cocaína era quase uma ficção. Mas ela chegou, como chegam todos os vícios, e fez um grande estrago por muito tempo. Hoje sabemos que o uso está bastante limitado. E 80% dos consumidores têm consciência dos males desse uso e procuram ajuda em clínicas especializadas.

Qual a sua relação com as drogas? Fala-se muito na descriminalização da maconha. Não sou favorável ao seu uso e legalização, mas concordo que seja descriminalizada.

Você chegou a usar drogas em alguns desses “booms” da maconha ou da cocaína? Experimentei maconha na juventude, mas não gostei. Não me atraiu. Quanto à cocaína, não conheço nem de vista.

A geração de artistas de hoje é mais saudável? Descobriu-se o prazer do corpo bonito. E bonito passou a ser traduzido por magro, esbelto. Isso levou homens e mulheres para as academias, calçadões, assim como adotaram uma alimentação mais saudável. Como o artista tem muita visibilidade na mídia ele passou a ser ou a parecer saudável.

As mulheres estão exagerando na questão da plástica? Sim. Todas as gerações passam por transformações, mas houve um momento em que era uma satisfação reservada. Por exemplo, quem vê o busto? O marido. Então é uma satisfação pessoal que ela dá ao marido e a ela mesma. Mas quando a coisa foi para a barriga, o rosto, os lábios, o pescoço começou a se definir um excesso. A mulher está grávida e diz: “Não vou amamentar! Peito caído chega. Senão, ele vai ter que pagar a plástica”. Aí começa a ficar um terreno perigoso, sem propósito. O homem vai pra cama com essa mulher e nem sabe o que é verdadeiro e o que não é. É capaz de não acreditar nem no orgasmo.

Acha que elas vão, assim, perdendo a identidade? As mulheres, muitas vezes, têm prazeres e alegrias pelos outros, e não por elas mesmas. Você pergunta para uma mulher: “Você é feliz?”. Ela diz: “Ah, tenho filhos lindos, tenho sorte que minha mãe está viva.”. Mas pergunto: “Você, quando deita na cama, seu marido já dormiu, como é que você é?”. Às vezes elas não sabem nem dizer. É o negócio de guardar um bombom.

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