Num tronco de Iroko vi a Iúna cantar

por Camila Alam

Erika Balbino lança livro infanto-juvenil para resgatar cultura afro brasileira

Elementos do folclore brasileiro, da umbanda e da capoeira estão misturados em Num tronco de Iroko vi a Iúna cantar, o primeiro livro de Erika Balbino (Ed. Peirópolis). A narrativa, voltada para o público infanto-juvenil, é uma fábula que acompanha os irmãos Cosme, Damião e Doum numa jornada lírica em torno do berimbau. A curiosidade dos meninos com o instrumento os leva a querer investigar a capoeira e partem juntos para aventuras na floresta. Para a autora, além de resgatar a cultura afro-brasileira para nossas crianças, o livro tenta quebrar o paradigma de heróis e heroínas que rondam as publicações infantis.

“A cultura afro-brasileira ainda é invisível. Seu ensino foi aprovado por lei, mas permanecemos no campo do aprendizado da cultura europeia, replicando valores já tão ultrapassados”, diz. A autora, que joga capoeira há 13 anos, decidiu complementar o livro com áudio. Para isso, chamou amigos e mestres das rodas que frequenta para narrar a história e registrar cantigas famosas pelas tradição oral. Num tronco de Iroko vi a Iúna cantar é ilustrado pelo grafiteiro Alexandre Keto, conhecido por desenvolver projetos comunitários e de intercâmbio em países africanos. Para a Tpm, Erika contou um pouco mais sobre o projeto e seu envolvimento com a capoeira. 

Tpm: Como começou o projeto e quanto tempo demorou pra virar realidade?
Erika Balbino: Conheci a Renata Borges, da Editora Peirópolis, durante as feiras organizadas pela LIBRE - Liga Brasileira de Editores. E daí trabalhamos juntas para a Secretaria de Cultura dentro do projeto Ônibus Biblioteca, onde eu fazia a gestão dos oficineiros, contadores de história, ilustradores. Comentava com a Renata que faltava livros sobre capoeira e ela me propôs escrever um pela editora dela. Não levei a sério, mas, em setembro de 2012, ela me pediu o livro. No começo, quis escrever algo muito didático sobre a capoeira em comunidades quilombolas, indígenas, centros de reabilitação motora. Estava dentro de uma festa de Cosme e Damião, que ocorre sempre em setembro, quando o enredo veio prontinho na minha cabeça. Indiquei o ilustrador Alexandre Keto, que tem um traço incrível, e a editora aceitou de pronto. Entreguei o primeiro esboço em julho de 2013 e em setembro do mesmo ano, mês de Cosme, o livro foi aprovado.

 

"Acho importante resgatar essa cultura cabocla e negra para as nossas crianças tão acostumadas com princesas" 



Você também joga capoeira, né? Me conta um pouco sobre como começou seu envolvimento com a prática e como é hoje.
Comecei a capoeira tarde, eu estava com 30 anos, hoje tenho 42. Foi algo que eu sempre quis fazer, mas comecei a trabalhar muito cedo e nunca tive tempo. Meu primeiro grupo foi o Canavial do Mestre Pelé, no Jardim Caraguatá, na zona sul. Após 3 anos, treinei com Mestre Caranguejo do grupo Vera Cruz, um dos mais antigos da cidade. Passei mais 4 anos e meio com Mestre Maurão da Capoeira Mandinga e durante todo esse tempo sempre fui próxima do Mestre Jamaica, da Tribo Unida de Itacaré, onde estou hoje oficialmente. Todos esses Mestres são grandes cantadores, grandes contadores de história. Certamente me influenciaram bastante e tem muita coisa deles nessas páginas.

Qual a importância de resgatarmos a cultura negra para as nossas crianças?
Eu acho importante resgatar essa cultura cabocla e negra para as nossas crianças tão acostumadas com princesas e beijos arrebatadores. Os heróis desse livro andam descansos e estão sempre curiosos em conhecer pessoas diferentes deles. E temos isso aqui. Esse caldeirão de pessoas tão distintas e, no entanto, parte integrante da nossa formação social e cultural. Meu livro não tem grandes pretensões. Eu quero só é ver as crianças se divertindo. É só um caruru no meio desse banquete que a literatura nos oferece.

Este é seu primeiro livro? Como é fazer o mergulho nos contos, ainda mais voltados para crianças?
Na verdade meu primeiro livro é um romance escrito em 2006 que será lançado ainda esse ano. Esse é o primeiro livro publicado. Eu vivo rodeada de crianças. Seja na capoeira, na minha vida normal, nas festas de terreiro. O Nirlando [Beirão, jornalista], que fez a orelha do livro, escreveu que esse é um livro para crianças, mas também para adultos teimosos. Acho que é isso. Trabalhei com o encantamento. Essa energia de Vungi que permeia toda e qualquer pessoa. Onde tem alegria, risada, traquinagem, tem Vungi.

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