Amor e paciência

por Fernando Luna
Tpm #132

No mês dos namorados, Tpm e Trip investigam o mesmo assunto: briga!

Atenção, este texto contém spoilers envolvendo discussões de relacionamento e sexo – nada, porém, sobre a próxima cena de Lena Dunham pelada em Girls.

A história aqui é entre Florence e Edward. Eles são “jovens, educados e ambos virgens nessa noite, sua noite de núpcias, e viviam num tempo em que conversar sobre dificuldades sexuais era completamente impossível”.

O tempo era 1962, o ano que terminou e pouca gente sentiu falta. As dificuldades sexuais? “Enquanto ele sofria apenas o nervosismo convencional da primeira noite, ela experimentava um horror visceral, uma náusea irremediável, tão palpável quanto um enjoo no mar”, como escreve o inglês Ian McEwan, em Na praia.

Pouco tempo depois, os anos 60 enfim se tornariam os anos 60, virando pelo avesso os costumes e elevando o sexo a trend topic de qualquer conversa de botequim. Mas nada disso podia ser imaginado ali naquele quarto de hotel à beira­mar, na costa de Dorset. Florence desconhecia a aflição de Edward, e Edward, a repulsa de Florence.

Uma boa DR, daquelas examinadas na reportagem “Discutir a relação de novo?”, na página 36, resolveria o problema deles e destruiria o livro.

Para azar das personagens e sorte do leitor (não é sempre assim quando o enredo é bom?), o desencontro na cama detona por 40 páginas um bate-boca incrivelmente destrutivo e comovente – quanto mais raivosa a troca de palavras, mais evidente que eles se amam e, ainda assim, continuam se aniquilando quase sem querer:

“Mas Edward rebateu com toda a força. ‘Você não faz a menor ideia de como se comportar com um homem. Se fizesse, isso nunca teria acontecido. Você nunca me deixou chegar perto. Você não conhece nada disso, não é? Leva as coisas como se estivéssemos em mil oitocentos e sessenta e dois. Você nem ao menos sabe beijar.’

Ela ouviu a si mesma dizer tranquilamente: ‘Eu reconheço o fracasso quando o vejo’. Mas não era isso o que queria dizer, essa crueldade nada tinha a ver com ela. Era apenas o segundo violino respondendo ao primeiro, uma defesa retórica provocada pela brusquidez, pela precisão do ataque dele, pelo escárnio que ela ouviu em todos os repetidos ‘você’. Quanta acusação ela deveria suportar num pequeno discurso?”

Faltou o casal reunir, como o narrador reconhece no final (avisei que tinha spoiler), as duas únicas coisas capazes de fazer uma discussão de relacionamento valer a pena: amor e paciência.

Fernando Luna, diretor editorial

Trip de junho também traz sua visão sobre o mesmo tema: Briga.

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